Arthur Soffiati - O impacto ambiental das COPs
Em 1992, William Rees propôs o conceito de pegada ecológica (footprint). Não se trata das marcas que os pés humanos deixam ao caminhar. Supõe-se que uma pessoa alta e pesada deixa pegadas profundas se caminhar numa estrada lamacenta. Mas, em se tratando de pegada ecológica, um corpo leve pode deixar uma forte pegada. No cálculo da pegada ecológica, entram o consumo por pessoa, empresa, instituição e país, assim como a natureza do que é consumido. Se os bens de consumo são produzidos com recursos naturais não-renováveis, a pegada é mais profunda. Além de não se renovarem, os recursos consumidos geram lixo não facilmente absorvível pela natureza. Tomemos o caso do carvão mineral, do petróleo e do gás natural. O estoque deles é finito, embora a natureza continue a produzi-los muito lentamente. Além do mais, o consumo deles produz gases que se acumulam na atmosfera e alteram o clima. O aquecimento progressivo da Terra deriva, principalmente, do acúmulo desses gases. De todos os problemas gerados pela economia de mercado, as mudanças climáticas são os mais preocupantes.
Todos os seres vivos produzem pegadas ecológicas. Elas vão além das marcas deixadas pela caminhada. Uma onça e um ser humano deixam sua pegada ecológica. A da onça tem sido a mesma desde que a espécie se constituiu. Ela caça para viver, mas não tira da natureza mais do que o necessário. E os animais caçados encontram tempo para se reproduzirem. Já o humano pode ter uma pegada leve ou pesada. Pode deixar marcas superficiais ou profundas.
As sociedades indígenas que ainda não tiveram contato com a economia de mercado (muito poucas) deixam marcas superficiais. Um indivíduo tipicamente ocidental deixa marcas indeléveis. Tomemos um multimilionário que investe maciçamente na indústria do petróleo, que tem vários automóveis, helicóptero, avião, iate, mansões etc. Sua pegada é de chumbo. Por outro lado, um mendigo que vive da caridade pública e mora na rua tem uma pegada muito leve. Portanto, o conceito de footprint traz, implícito, uma crítica à desigualdade social. Mas, no todo, alerta para o perigo representado pelas sociedades industriais no seu consumismo.
Diante dos problemas ambientais gerados pela globalização da economia de mercado, lideranças políticas, empresariais, científicas e populares têm promovido reuniões mundiais em busca de acordos e soluções. São as Conferências das Partes, popularmente conhecidas como COPs. Como já observado, as mudanças climáticas têm merecido destaque, mas também são promovidas reuniões para discutir o empobrecimento da biodiversidade, os problemas que afetam os oceanos etc. A COP de Paris, em 2015, definiu que governos e empresas de todo o mundo cumpririam a meta de não permitir que as temperaturas do planeta ultrapassassem 1.5º C em relação aos níveis pré-industriais.
Esses níveis já foram ultrapassados nos últimos dez anos. Se não se mantêm o tempo todo, a verdade é que já podemos experimentá-los no nosso dia a dia. E seus efeitos são devastadores, com aquecimento dos oceanos, derretimento de geleiras, estresse de plantas e animais, chuvas e secas intensos, mortes de pessoas e muito mais.
Então, cabe a pergunta: qual a contribuição das COPs do clima para o aquecimento global? Se elas não estão conseguindo chegar a um acordo quanto ao financiamento da transição de uma economia de alto-carbono para uma de baixo-carbono; se os debates entre governos e empresários trazem pouco ou nenhum resultado favorável ao controle das temperaturas; se a propaganda que usa o slogan da sustentabilidade oculta práticas que nos levaram à situação atual e até as aprofunda, podemos concluir que as COPs produzem mais impactos ambientais do que os reduzem.
Será que os impactos ambientais das COPs já foram contabilizados? Pensemos na COP-30, a ser realizada em Belém do Pará em novembro de 2025. Pensemos nos investimentos que estão sendo feitos na cidade para sediar a COP. Conversando com um taxista em viagem recente a Belém, ele disse que nunca viu tanta obra sendo feita em tão pouco tempo. Até aí, tudo bem. Ganha a população. Mas ele perguntou a si mesmo se elas serão conservadas depois que tudo acabar. Contabilizemos os voos de avião de vários e distantes lugares do mundo para a principal cidade do norte do Brasil. Incluamos a necessidade de hospedagem. Macapá está se preparando para hospedar aqueles que quiserem fugir da muvuca. E o consumo da multidão de pessoas que vão se concentrar durante o evento? E o que o Brasil tem a apresentar depois da aprovação do Projeto de Lei da Devastação pelo Senado? Do loteamento de poços de petróleo? Do desejo de explorar petróleo na foz do rio Amazonas?
Os impactos ambientais das COPs são reais. Os objetivos das COPs são apenas intenções ostentadas sob aplausos para o mundo. Por trás, pouco muda. Os combustíveis fósseis continuam sendo explorados de forma exponencial, exploração oculta pela propaganda da sustentabilidade e da transição energética. A população, por sua vez, continua apática. As COPs têm se tornado uma grande oportunidade de negócios. Os possíveis avanços das COPs não compensam os impactos ambientais que elas causam.