Arthur Soffiati - Em busca das raízes: Amazônia
* Arthur Soffiati 12/07/2025 13:41 - Atualizado em 12/07/2025 13:41

Creio que, na minha idade e no nível de especulação intelectual que, aos 78 anos, alcancei, não existe mais muito sentido em buscar as raízes culturais da minha existência. Sei que sou humano, que vivo no planeta Terra, no Holoceno (até prova em contrário), no período, por um dos calendários existentes, entre 1947 e 2025.
No entanto, venho dos tempos analógicos. Sou um pensador mestiço no tempo e no espaço. Busco o mundo na região em que vivo. Busco minha região no mundo. Busco compreender o país em que nasci à luz do processo de globalização. Busco as raízes culturais do Brasil. Procuro compreender a ocidentalização desse território batizado com o nome de Brasil, assim como busco entender os impactos sobre a natureza que a cultura ocidental, adaptada ao território brasileiro, vem causando. Não apenas entender, mas também me posicionar e atuar contra uma civilização ecologicamente insustentável.
Nessa busca, visitei a Península Ibérica em 2024 fugindo das metrópoles. Busquei o Portugal profundo nas pequenas cidades, nos vilarejos, nas ilhas, no campo, nas poucas florestas, nos rios domesticados etc.
Meu projeto consiste em conhecer a Amazônia e a África também. No que concerne à Amazônia, uma viagem de 20 dias em maio de 2025 visou percorrê-la de noroeste a leste. Espero reunir forças e recursos financeiros para conhecer a África em 2026. Nessas viagens, que são verdadeiras excursões científicas, busco tanto as raízes culturais do Brasil, o processo de globalização e os impactos ambientais do tempo presente.
Num roteiro bastante pensado, contando com poucos recursos financeiros e com as limitações impostas pela idade, segui a linha do Equador, embora não tenha mantido os pés sobre ela o tempo todo. Viajando do Rio de Janeiro a Campinas e a Manaus, subimos o rio Negro até a cidade de São Gabriel da Cachoeira, nas imediações da linha do Equador. O rio Negro apresenta um fascínio especial desde, pelo menos, o século XVIII.
Meu desejo era também subir o rio Solimões até Tabatinga, na fronteira do Brasil com o Peru. Se possível, alcançar a cidade de Iquitos, neste segundo país, como fez Mário de Andrade no longínquo ano de 1927. Não foi possível e não sei se será. Da mesma forma, eu gostaria de retornar a Portugal para visitar apenas a ilhas de Porto Santo e as oito que formam o arquipélago dos Açores. Sei de pessoas que vão à Europa para ficar nas grandes cidades e se divertir em baladas. Nada mais estranho a mim do que isso.
De São Gabriel da Cachoeira, retornamos a Manaus e partimos numa viagem naval até Belém. Foi uma excursão encantada num catamarã navegando por aquele mundo de água. Agora mais volumoso com a enchente. O mês de maio foi meticulosamente escolhido para encontrar os rios cheios. Navegamos na média, em camarote, mas vendo como viajam os amazônidas, em redes.
Belém está em obras para receber a COP-30 sobre mudanças climáticas. Estivemos lá em 2018. Pessoalmente, estive lá duas vezes antes. Passamos apenas um dia na cidade e rumamos para Macapá, novamente nos acercando da linha do Equador. Se o sotaque belenense se assemelha ao carioca, o amapaense o exagera. Em Macapá, todos falam como Davi Alcolumbre, presidente do Senado Federal.
Estávamos no estuário do Amazonas. A impressão era de estarmos na beira do mar. Transatlânticos ancoram ali com toda a facilidade. As marés são muito altas. A água salgada como que empurra a água doce, fazendo-a se avolumar. Bosques de mangue preto, com árvores altíssimas, deixam à mostra raízes respiratórias na maré baixa, enquanto que, na maré alta, a água alcança metade do tronco.
O objetivo final da excursão era atravessar aquele mar diante de nós e chegar novamente à ilha de Marajó. Estivemos nela em 2018, em Soure, andando em terra firme. Agora, íamos para o norte, onde fica a pequena cidade de Afuá. Toda ela, ou quase toda, é uma cidade palafita, onde só se pode andar a pé ou de bicicleta. Automóveis não entram. Não há ruas para eles.
Ainda nos acercando da linha do Equador, enfrentamos forte calor. Estávamos chegando ao fim da viagem. Cabia agora retornar a Macapá e, de lá, ao Rio de Janeiro passando por Brasília. Foi mais uma viagem encantada que merece uma abordagem mais detalhada.
*Professor, historiador, escritor e ambientalista

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