Felipe Manhães - Prontuário: um dever do médico, um direito do consumidor
Felipe Manhães 24/09/2025 07:37 - Atualizado em 24/09/2025 07:37
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Felipe Manhães / Reprodução
O prontuário médico é um direito do consumidor, que decorre do próprio Código de Defesa do Consumidor, e um dever do médico, previsto no Código de Ética Médica, e ambos devem estar atentos às suas regras.
Por definição, o prontuário é um conjunto de informações do paciente, como anamnese, exames, medicamentos administrados, condições de saúde, etc., reunidos em um documento.
Engana-se quem acha que é de propriedade do médico ou hospital. Estes têm o dever de guardá-lo. O consumidor é o verdadeiro dono dessa coletânea de informações suas e tem o direito de receber uma cópia, a qualquer tempo.
O Art. 43 do CDC prevê que o consumidor – e aqui o paciente é considerado consumidor – terá acesso às informações existentes em cadastros, fichas, registros e dados pessoais arquivados sobre ele, bem como sobre as suas respectivas fontes.
Além disso, a abertura do prontuário deverá ser comunicada por escrito ao consumidor ou seu acompanhante, caso esteja impossibilitado de recebê-lo.
A lei ainda determina que as informações sejam prestadas de forma objetiva, clara, verdadeira e em linguagem de fácil compreensão. O consumidor, sempre que encontrar inexatidão nos seus dados, poderá exigir sua imediata correção.
Ainda de acordo com o CDC, o prontuário deve ser disponibilizado em formato acessível, inclusive para pessoas com deficiência, mediante solicitação do consumidor.
O Código de Ética Médica, por sua vez, em diversos artigos trata do prontuário.
O Art. 87 prevê que é vedado ao médico deixar de elaborar prontuário legível para cada paciente e determina, em seus parágrafos seguintes, que o prontuário deve conter os dados clínicos necessários para a boa condução do caso, sendo preenchido e assinado com o número de registro do médico no Conselho Regional de Medicina.
Negar ao paciente ou, na sua impossibilidade, a seu representante legal, acesso ao seu prontuário, deixar de lhe fornecer cópia quando solicitada, bem como deixar de lhe dar explicações necessárias à sua compreensão, salvo quando ocasionarem riscos ao próprio paciente ou a terceiros, é uma infração ética grave.
Quando se fala em atendimento médico no Direito, costuma-se dividir a responsabilidade do médico pelo seu resultado. De um lado, o médico que presta um atendimento de meio, e de outro, o médico que promete um resultado, ou seja, um atendimento fim, cujos exemplos clássicos, respectivamente, são o médico que atua na emergencial de um hospital e o cirurgião plástico. Este último promete um resultado e tem o dever de cumpri-lo à luz do CDC, enquanto o outro, geralmente tem sua conduta vigiada pelo Código Civil.
No entanto, é preciso delimitar as ações praticadas e as responsabilidades de cada ato individualmente. Em relação ao prontuário médico, independe o tipo de atendimento médico prestado, seja de meio ou de fim. Em todos eles, é o Código de Defesa do Consumidor que abrange a relação jurídica com o paciente. O prontuário é uma obrigação objetiva do médico, portanto, se aplica o CDC, mesmo que seja um tipo de atendimento sem obrigação de resultado.
O Conselho Federal de Medicina, por meio da Resolução CFM nº. 1.638/2002, estabelece que o registro deve ser claro, completo, legível e cronologicamente organizado.
Quando o prontuário não atende a esses e outros requisitos, o médico pode responder a processo ético-profissional perante o CRM, sujeito a sanções que variam de advertência confidencial à cassação do exercício profissional, a depender da gravidade da conduta.
Mesmo com a competência da matéria coberta pelo Código de Defesa do Consumidor, também do ponto de vista civil a falta de registro adequado pode ser interpretada como negligência, abrindo espaço para condenações por danos morais, materiais e estéticos. Em muitas decisões judiciais, um prontuário incompleto, ou sua ausência, são fatores determinantes para o reconhecimento da responsabilidade médica.
Em certos casos, a falta ou má elaboração do prontuário pode atrair, ainda, a responsabilidade criminal. O Código Penal, em seu art. 299, tipifica como crime a falsidade ideológica, punindo aquele que insere ou omite informação com o intuito de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante. No caso do prontuário, isso pode ocorrer, por exemplo, quando um médico omite complicações, modifica datas ou altera condutas registradas para ocultar eventual erro.
Há também outra infração penal, esta prevista no próprio Código de Defesa do Consumidor, no Art. 72, que prevê a pena de detenção de seis meses a um ano ou multa para quem impedir ou dificultar o acesso do consumidor às informações que sobre ele constem em cadastros, banco de dados, fichas e registros.
Portanto, se não por todas essas determinações administrativas, civis e criminais, o médico/hospital deve cuidar do prontuário, principalmente, por ser de extrema importância para a saúde e para a vida do paciente.

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