Raquel Chaffin Cezario
01/09/2025 11:49 - Atualizado em 01/09/2025 11:48
Panorâmica Porto do Açu, 28/07/2025
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Ricardo Stuckert, Presidência da República
Estudei o cenário de São João da Barra (RJ) ao longo do meu mestrado e doutorado, e escrevi em 26/02/24, aqui mesmo na Folha da Manhã, sobre os problemas de um planejamento urbano competitivo e flexível, orientado pelo e para o mercado. Iniciando, porém, uma nova fase em meu percurso acadêmico, faço um esforço para tomar o mesmo objeto de estudo — a construção coletiva de uma cidade democrática — sob outro ponto de vista. Sem fechar os olhos para os problemas vivenciados na fase de implantação do Porto do Açu, busco prospectar avanços para a coletividade local.
Tendo ingressado recentemente em estágio pós-doutoral no Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política da Uenf, estou me dedicando ao tema dos chamados portos e cidades inteligentes. O estudo procura identificar as principais possibilidades de contribuição do Porto do Açu para a institucionalização de políticas públicas que tornem as cidades ao seu redor mais inteligentes.
De acordo com o Relatório Mundial das Cidades, emitido pela ONU em 2022, 68% da população mundial será urbana até o ano de 2050. Em municípios como São João da Barra (79,8%) e Campos dos Goytacazes (92,6%), o Censo 2022 do IBGE já demonstra que a população urbana é maior do que a rural. Em função desse crescimento e com o intuito de aumentar a justiça social, melhorar a qualidade de vida dos cidadãos, tornar o espaço citadino sustentável, bem como solucionar problemas urbanos, surgiram as smart cities, ou seja, as cidades inteligentes.
Tal conceito pode ser apresentado a partir de várias perspectivas e visões, mas há entre elas um consenso: uma cidade inteligente deve dinamizar o desenvolvimento socioeconômico local, seguindo uma estratégia cidadã e democrática que situa a população no processo da ação, tendo a tecnologia e a inovação como instrumentos para responder aos desafios existentes, sem renunciar à sustentabilidade.
No contexto brasileiro, esse conceito tem sido acionado nas áreas da digitalização de serviços, da sustentabilidade ambiental e da participação cidadã, com experiências em São Paulo, Curitiba, Rio de Janeiro, Campinas e Recife, envolvendo desde mobilidade inteligente até centros integrados de monitoramento. Em Campos, como exemplo pontual até abril de 2021, tivemos o Mobi Campos, um aplicativo que permitia ao usuário monitorar a posição dos ônibus urbanos em tempo real, o que permitia ao passageiro evitar esperas desnecessárias e gerava mais segurança nos pontos.
Em tese, o Porto do Açu pode trazer avanços em inovação, eficiência e qualidade de vida para seus habitantes. Algumas ações apontam para essa direção, como o projeto Cais Açu Lab, que busca cooperação com empresas, instituições de pesquisa, órgãos governamentais e comunidades locais. Outro exemplo é o projeto “Transformando o Presente, Projetando o Futuro” (TPPF), cujo objetivo é melhorar a educação básica e reduzir a evasão escolar em São João da Barra. Ele é patrocinado pela Chevron Brasil — importante parceiro e cliente do Porto do Açu — em cooperação com o Instituto Aliança e a Secretaria Municipal de Educação (Semed) sanjoanense.
O Porto do Açu não precisa se limitar apenas à função de infraestrutura logística, mas desponta como uma plataforma estratégica para a construção de um território mais inovador, sustentável e conectado, podendo ser um agente de transformação urbana e social. Estudar potencialidades e limites desse cenário é uma tentativa para ajudar a desfazer a indiferença do empreendimento com o seu entono. Evidentemente, a efetivação dessa agenda não é simples e depende não apenas da adoção de Tecnologias de Inovação e Comunicação (TIC), mas também de políticas públicas integradas, participação ativa dos cidadãos e parcerias entre os setores público, privado e o meio acadêmico.
Raquel Chaffin Cezario é pós-doutoranda e doutora em Sociologia Política, mestra em Políticas Sociais e pesquisadora do Núcleo Norte Fluminense do INCT Observatório das Metrópoles Núcleo Norte Fluminense. Atua como articuladora de políticas públicas na Secretaria de Educação de São João da Barra (RJ).