Entre fortunas, erros e virtudes, Campos decidiu reeleger o príncipe
07/10/2024 | 08h19
Arte digital criada com IA
Arte digital criada com IA / Edmundo Siqueira


Foi em primeiro turno. Em votos válidos, Wladimir recebeu 69,11%. Uma vitória esmagadora que provou que o prefeito de Campos não teve apenas habilidade política ou o bom uso do sobrenome que carrega. Quem acompanhou o jogo pôde perceber que ele soube trabalhar com dois fatores essenciais da política: a “virtù” e a “fortuna”.

Essa coisa de virtude e fortuna foi explicada na política por Nicolau Maquiavel — que era tudo, menos um ingênuo —, quando escreveu sua obra seminal “O Príncipe”, em meados de 1500. Em suma, o governante precisa de talento para liderar (virtù) e sorte para aproveitar as oportunidades (fortuna).

Wladimir, que não nasceu ontem, soube jogar com os dois. De um lado, ele carregou a política local nas costas, fazendo o que sabe fazer melhor: articulação. De outro, teve a sorte de navegar por um cenário onde seus adversários somados não conseguiram chegar a 10% dos votos, com exceção da Delegada Madeleine, que conseguiu 24,22% dos votos válidos, e mostrou forte consistência em todas as zonas eleitorais.

Em Campos, uma cidade com problemas endêmicos de infraestrutura e serviços públicos deficitários, principalmente em transporte, ele conseguiu o que parecia improvável: alta popularidade, alta taxa de conhecimento e a reversão de uma impopularidade histórica de seu grupo na chamada “pedra”, na zona 98. Isso não é pouco. Maquiavel aplaudiria.

Ele soube usar a máquina pública para agradar o povo com programas sociais, melhorias pontuais e espetacularização do fazer político. E ainda mais importante: Wladimir conhece o cheiro do poder e, como bom estrategista, sabe quando avançar e quando recuar. E demonstrou uma baita habilidade em gestão de crises.

A exceção, que confirma a regra, foi a relação com a Câmara, que não soube manejar e acabou perdendo a presidência em um momento crucial para seu governo, momento onde também recebeu questionamentos agressivos da oposição.
Folha1
A “fortuna”
A sorte (fortuna) sorriu para ele quando seu xará, o presidente da Rússia Vladimir Putin, iniciou contra a Ucrânia, um de seus países vizinhos, uma invasão militar, marcando uma escalada para um conflito que começou em 2014. Entre outros fatores, a guerra elevou o preço do barril de petróleo, e a petrorentista Campos viu seus cofres gordos novamente. Soma-se a isso uma retomada natural da economia no pós-pandemia, e o cenário é bastante favorável.

A sorte foi dele, e ele soube aproveitá-la. Maquiavel dizia que a “virtù” do governante é sua capacidade de se adaptar às circunstâncias. O resultado eleitoral refletiu a sorte e a virtude Wladimir, mas também foi permitida por uma oposição que não soube se organizar. Parecia que todas as forças estavam fora de lugar na campanha. Os números estampados nos bonés muitas vezes eram diferentes da atuação partidária. Havia bipolaridade em uma oposição que deveria estar plenamente sadia. Além da campanha, a “pacificação” de antes, entre o grupo Bacellar e Wladimir favoreceu o prefeito, que fez cara de paisagem e colheu os frutos dela.

Contrariar as estatísticas é o desafio
Wladimir Garotinho navegou com destreza entre a virtù e a fortuna. Ele fez o que precisava, jogou com as cartas que tinha e venceu a partida. Mas o problema de brincar de príncipe é que o castelo, uma hora ou outra, pode começar a ruir. Não será o primeiro, nem o último a ver a “fortuna” mudar de humor.

Campos dos Goytacazes, esse feudo resistente, pode ser generosa com seus líderes, mas é impiedosa quando as promessas não resistem à realidade. Wladimir, esperto como o clã lhe ensinou, sabe que o jogo não acabou. Se Maquiavel estivesse por aqui, talvez dissesse que agora começa o verdadeiro teste: sobreviver à própria sombra.

E aí, meu caro Wladimir, quando a “fortuna” cansar de você, seu verdadeiro feito vai ser contrariar o que lhe favoreceu nessa eleição: as estatísticas. Precisará fazer um segundo governo melhor que o primeiro.
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O pai e a necessidade de holofotes
13/08/2023 | 10h44
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Na mitologia grega, uma dos arquétipos paternos conhecidos é Urano, que nasceu de Géia (algo como uma mãe-terra, geradora de tudo) e passou a ser seu companheiro, tendo com ela os doze titãs, sendo Cronos o último dos 12 titãs do deus Urano.

Urano simboliza o céu, as estrelas. Precisa de luz a todo momento, vivendo e absorvendo a iluminação. Era um tipo de deus que temia o poder de outros deuses, mesmo que eles fossem seus filhos. Após terem os 12 titãs, Géia e Urano tiveram mais seis filhos, e o pai, temendo que seus poderes ficassem grandes demais, prendeu a nova prole no útero da mãe novamente.
Essa prisão materna era especialmente perversa para Géia, que pediu ajuda dos primeiros filhos para libertar da prisão, ela e seus irmãos, do castigo perverso do pai.

O único que aceitou salvar a mãe e seus irmãos foi Cronos. A tirania do pai o afetava, e ele estava cansado de ver Urano como um genitor apenas, alguém que desconhece a função paterna, que estaria ali simplesmente para gerar, e para afirmar sua própria masculinidade. Urano não demonstrava nenhuma culpa ou angústia perante os filhos, os vendo como algo que nasceu para servi-lo, e não ameaçá-lo.

Perante a tirania, Cronos decide agir e castra seu pai, Urano. Assim liberta os seus irmãos da prisão na mãe, e inaugura a era do pai patriarcal, o pai agente da lei. A partir dele, o ego não estaria mais à mercê do mundo, e não lutaria apenas pela sobrevivência; não estaria mais entregue aos impulsos.

O filho Cronos começa a inserir-se no mundo da cultura, dos limites e da construção existencial. Com o simbolismo do ato de violência contra o pai, começa então a se deslocar de uma posição passiva para uma posição mais ativa no mundo.

A simbologia da mitologia grega explicita que não é papel do pai ser tirânico e mercurial. É função primordial do pai direcionar luz para seus filhos, pois a vida irá florescer novamente em sua prole. A lei da natureza determina que há o tempo do pai, e há o tempo do filho, e que eles não podem ser conflitantes e sim complementares.

O exemplo de Cronos também evidencia que contra um pai tirano restam poucas opções, e quando a tirania recai sobre filhos, com a complacência ou submissão da companheira, o resultado pode ser desastroso.

Nos espólios da guerra, territórios antes conquistados podem ser perdidos. E embora a relação entre pais e filhos possam ser por vezes conflituosas, existem limites a serem obedecidos. Quando se busca a luz, a qualquer custo, sombras podem encobrir as próprias vitórias.

E pior: quando há uma disputa visceral pela luz e pelos holofotes, as consequências podem recair sobre os que dependem dos líderes, e fazer com que o Olimpo , antes buscado como ideal, passe a ficar cada vez mais distante.
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As perguntas ainda não respondidas na Câmara de Campos
18/04/2022 | 10h04
Talvez o único consenso que há sobre a trama da novela trágica que se arrasta na Câmara de Vereadores é que ela precisa de um desfecho. Como todo enredo, o encadeamento de eventos que vão compondo as narrativas da trama principal precisa resultar em algo com princípio, meio e fim. E o fim depende de respostas a algumas perguntas.

Para respondê-las, os vereadores precisam se submeter ao estado democrático de direito e a prevalência das leis e regimento. As narrativas importam, mas elas precisam estar amparadas nos normativos quando tratamos de poder público.
A trama começa com a antecipação da eleição para a Mesa Diretora, onde a base governista perdeu, inclusive tendo o resultado declarado pelo candidato à reeleição derrotado, Fábio Ribeiro. Depois da “traição” do vereador Maicon Cruz — que havia acordado voto em Fábio —, e o “não voto” de Nildo Cardoso durante a votação, de forma nominal, a eleição foi anulada.
Em contragolpe, a oposição tenta a retomada da sessão que deu vitória a Marquinhos Bacellar na justiça, mas é negada em duas instâncias. Após paralisação por mais de um mês, as sessões foram retomadas com a abertura de processo para destituição da presidência da Casa. Dobrando a aposta, a situação abre procedimento para a perda de mandato dos 13 vereadores oposicionistas.
Esse fio de acontecimentos coloca a Câmara na situação que hoje se encontra: inoperante e com a imagem manchada. Algumas perguntas ainda parecem sem respostas. Quais sejam:
Câmara de Vereadores: Eleição anulada, pedidos de destituição e cassação, e paralisia legislativa.
Câmara de Vereadores: Eleição anulada, pedidos de destituição e cassação, e paralisia legislativa. / Aldir Sales
 
1 – Os 13 vereadores oposicionistas compõe um bloco parlamentar? A resposta a essa pergunta pode parecer sem importância, mas conferem aos 13 vereadores, que hoje se colocam como oposição, prerrogativas e vantagens legais e regimentais específicas. Eles, os 13, formariam um bloco parlamentar, de fato? Como tal, foi comunicado à Mesa Diretora a sua formação?
2 – Houve obstrução ou falta dos vereadores? As ausências dos vereadores de oposição aconteceram como forma de protesto, onde alegava-se abuso de poder por parte do presidente Fábio Ribeiro, e como forma de pressão para que a eleição da Mesa fosse retomada. Esse movimento pode ser caracterizado como “obstrução”, o que é legítimo das minorias em uma Casa Legislativa. O próprio regimento da Câmara de Campos, na seção sobre perda de mandato, ressalva o movimento para computar as faltas: “se em obstrução declarada por líder partidário ou de bloco parlamentar”.
Portanto, estando o vereador em exercício do seu mandato, em atividades inerentes ao seu cargo, mas não comparecer as votações como forma de obstrução, pode ser considerado um movimento político legítimo. Mas, os 13 representam um bloco parlamentar?
3 – É cassação ou perda de mandato? Uma vez considerada como faltas as ausências dos vereadores, e indeferidas as justificativas, é prerrogativa da Mesa Diretora decretar a perda de mandato, podendo ser de ofício, sem a necessidade de passar pelo plenário ou mesmo tendo o pedido de algum vereador.
Diz a Constituição Federal, no artigo 55:
“Perderá o mandato o Deputado ou Senador (parlamentar municipal pode se equipara aqui): que deixar de comparecer, em cada sessão legislativa, à terça parte das sessões ordinárias da Casa a que pertencer, salvo licença ou missão por esta autorizada”.
Diz a Lei Orgânica de Campos, no artigo 14, inciso III:
“Perderá o mandato o Vereador: que deixar de comparecer, em cada ano parlamentar, à terça parte das sessões ordinárias da Casa, ou a 05 (cinco) sessões em cada mês, mesmo não subsequentes, salvo por motivo de força maior, licença ou missão por esta autorizada”.
Diz o Regimento da Câmara, no artigo 14:
“Compete à Mesa da Câmara, privativamente, em colegiado: declarar a perda do mandato do Vereador, de ofício ou por provocação de qualquer Vereador, do suplente de Vereador ou de partido político representado na Câmara, nas hipóteses previstas nos incisos III a VI do artigo 14 (acima) da Lei Orgânica do Município, assegurada ampla defesa".
Portanto, uma vez cumpridos os ritos necessários, é facultado à Mesa Diretora determinar a perda de mandato dos vereadores faltantes com justificativas indeferidas. É a lei, não a vontade do presidente. É, em última análise, a prevalência da lei e do regimento. Porém, foi assegurada a ampla defesa? Por qual meio?
Além de responder esses questionamentos, é preciso diferenciar o que se entende por perda de mandato e cassação. Este último ato, cassar um mandato de vereador, ou 13, cabe ao plenário da Casa, não à Mesa. Declarar perda de mandato por faltas nas sessões, sim, é ato próprio da Mesa.
4 – A quantas anda o processo de destituição do presidente da Casa? Foi lida em plenário uma “representação subscrita pela maioria absoluta da Câmara”, pelo vereador Anderson de Matos, um dos signatários, um pedido de destituição da Mesa Diretora da Câmara. Cumprido, ali, estritamente o regimento. Depois foi realizado o sorteio de “três vereadores, entre os desimpedidos, para constituírem a Comissão Processante”.
Novamente o regimento estava sendo cumprido, na íntegra. Mas, o que acontece depois disso? A Comissão Processante teria 48 horas para se reunir. O fez? Depois, três dias para notificar os acusados, o que abre um prazo de 10 dias apresentação da defesa. Tendo “posse ou não da defesa prévia, procederá (a Comissão) às diligências que entender necessárias, emitindo, ao final, seu parecer”. O parecer foi emitido?
O regimento não pode ser cumprido pela metade. Uma vez iniciados os ritos, eles devem ser finalizados. Assim como essa novela, os atos dos vereadores quando amparados por dispositivos legais devem ter desfecho. Assim como a cassação dos 13, a destituição deve ser decidida em plenário, após o parecer da Comissão.
Arquivo Público
Casa de Leis deve obedecer a elas
– Demonstrando inabilidade para o diálogo, os 25 vereadores precisam, ao menos, respeitar os ordenamentos — internos e externos. Cabe a um Parlamento elaborar novas determinações legais ou alterar as leis vigentes. E para isso configura-se em um colegiado, que possui outros órgãos internos com capacidade decisória. São sempre decisões coletivas, e devem ser sempre pensadas na coletividade.

Não aceitar a derrota no voto e usar todas as brechas possíveis para tentar reverter o resultado é uma atitude que demonstra uso excessivo do poder conferido. Mas obedece aos ditames regimentais e utiliza interpretações possíveis de leis estabelecidas. Cassar 13 vereadores não cabe à Mesa, cabe ao plenário. Correr com votações depois dos possíveis suplentes tomarem posse, não é moral, embora, cumprido os ritos, legal. Mas cabe judicialização, neste caso.  
Faltar às sessões é um ato de renúncia do parlamentar. Demonstra descumprimento de suas funções mais básicas e, de acordo com o Regimento, construído coletivamente, enseja perda de mandato. Porém não aconteceu isoladamente, fazia parte de um movimento de obstrução legítimo aos parlamentares. Não seriam faltas, e sim jogo duro parlamentar, mas dentro da democracia. Mas deixar inoperante um poder, fundamental em uma cidade que possui mais 137 mil pessoas em extrema pobreza, não é moral, embora possa ser considerado um movimento legítimo.
Quando o diálogo — em uma casa que precisa dele como instrumento — se mostra impossível, a lei deve imperar. E ela deve impor o desfecho desse enredo trágico.
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Os bustos envergonhados no corredor da Câmara de Vereadores
17/04/2022 | 10h43
Reprodução.
13 de maio de 2015. O corredor cultural da Câmara era inaugurado pelo então presidente reeleito da Casa, Edson Batista (com muitos serviços prestados na cultura). O busto de José do Patrocínio — campista símbolo da luta abolicionista — constituiu o espaço, que depois receberia Benta Pereira, Nilo Peçanha, Capitão Kirk, pai e filho Lamego, Feydit e uma representação dos Sete Capitães.
Hoje, meados de abril de 2022, os vultos campistas, que estão posicionados de forma a olhar para o Parlamento, se envergonham do momento que a Casa atravessa.
Ainda mais difícil do que saber qual personagem homenageado no corredor cultural da Câmara é mais relevante na história de Campos, é conseguir definir qual dos lados — situação ou oposição — tem mais responsabilidade pela guerra que se tornou a Casa de Leis. Talvez seja mais justo dizer que estão errados os dois — ou os 25 vereadores.
Aliás, quando grupos de poder se digladiam por cargos que podem ser decididos nos próximos oito meses, e paralisam por completo os trabalhos do legislativo por isso, dificilmente seria obra de um grupo só. Além do poder local, interesses regionais se mostram determinantes na luta mesquinha do poder pelo poder, sem interesse público algum.
Ainda mais grave, políticos que não representam cargos públicos municipais, não foram eleitos pelo poder representativo pelos campistas, ditam as regras e influenciam no “esticar da corda” na Câmara. Os patriarcas dos grupos Bacellar e Garotinho frequentemente manifestam publicamente suas opiniões e por vezes se fazem presente nas sessões. Além do ex-secretário de estado, Rodrigo Bacellar e Caio Vianna, secretário de Tecnologia, Ciência e Inovação de Niterói.
Benta Pereira estaria envergonhada da Câmara que ela teve que criar com muita luta, de forma revolucionária contra os desmandos do Império. Capitão Kirk, campista e primeiro aviador militar do Exército Brasileiro, igualmente ruborescido, assustado com a falta de honra de alguns.
Os bustos envergonhados têm em comum a coletividade de suas lutas. Ou, pelo menos, a institucionalidade de suas batalhas. Aqueles personagens que hoje olham para a Câmara em estátuas de bronze, lutavam por algo maior que eles, algo que representasse um símbolo, uma instituição, um ideal. Tomemos como exemplo José do Patrocínio, o Tigre da Abolição, filho de uma escrava alforriada e de um padre, dedicou sua vida para salvar as pessoas que no Brasil ainda viviam sob a perversidade da escravidão.
Qual a solução para a atual guerra na Câmara? Qualquer caminho que coloque o interesse público como norte. E que honre os bustos que olham para Câmara envergonhados.
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Bolsonaro veio fazer campanha em Campos com adesão de Clarissa e Garotinho
05/02/2022 | 05h23
Presidente da República é recebido em Campos - Wladimir, Tassiana e Frederico usam máscaras. Clarissa e Bolsonaro, não.
Presidente da República é recebido em Campos - Wladimir, Tassiana e Frederico usam máscaras. Clarissa e Bolsonaro, não. / Letycia Rocha
A visita do presidente Jair Bolsonaro à região, na última segunda (31), foi oficial. Tratou de investimentos, principalmente relacionados ao Porto do Açu, em sua maioria oriundo de dinheiro privado. Mas também fez campanha.
Em São João da Barra — acompanhado pelo clã Garotinho, Anthony, Rosinha, e os filhos do casal, Clarissa, deputada federal (Pros), e Wladimir (PSD), prefeito de Campos — Bolsonaro tratou de atacar o PT e a “esquerdalha”, palavra utilizada pelo presidente.
"Estamos numa guerra. Se aquele bando, aquela quadrilha, voltar, não vai ser apenas a Petrobras que vai ser arrasada. Vão roubar a nossa liberdade" — disse o presidente. Bolsonaro atua no conflito, único “lugar político” que sabe. Ao tratar a disputa como uma “guerra” trata a oposição como seus inimigos; não como adversários. E, contra inimigos, a disputa passa a ser em terreno distinto do democrático.
E volta a falar em “roubo de liberdade”. A liberdade no país foi frontalmente ameaçada por Bolsonaro como “nunca antes na história deste país”. No último 7 de setembro, apoiado por manifestantes, o presidente ameaçou a democracia brasileira de golpe. Não conseguiu, mas não por falta de vontade. A liberdade individual esbarra na lei, na saúde pública, e na legislação eleitoral. Apesar da claque bolsonarista não entender, a liberdade não é uma licença para cometer crimes.
""Estamos numa guerra. Se aquele bando, aquela quadrilha, voltar, não vai ser apenas a Petrobras que vai ser arrasada. Vão roubar a nossa liberdade" — disse o presidente. Bolsonaro atua no conflito, único “lugar político” que sabe." ()
Continuando, em falas que podem ser claramente tipificadas como campanha eleitoral antecipada e uso irregular de recursos públicos para financiar campanha, Bolsonaro disse, em Itaboraí, referindo-se a Lula: “o cara que quase quebrou o país de vez, que destinou um prejuízo de quase um trilhão de reais da Petrobras, quer voltar à cena do crime”.

Além de campanha desavergonhada, cita fatos que não guardam relação com a realidade. Apesar de o governo Dilma ter levado a uma recessão histórica, o governo Lula conferiu ao país o selo de bom pagador das agências internacionais de risco, pela primeira vez na história. Condição que perdeu nunca mais recuperou. Portanto, não esteve “quase quebrando o país”. Os prejuízos da Petrobras foram inúmeros, inclusive no governo atual, mas possuem causas bem mais complexas que um número não explicado de 1 trilhão.
Em Campos, o ministro da Cidadania, João Roma agradeceu ao presidente Bolsonaro pelo “maior programa social da história do país”. Fazia referência ao ‘Bolsa Família’, criado por Lula, transformado hoje em ‘Auxílio Brasil’. Fazendo justiça, vale lembrar que a origem se dá no governo Fernando Henrique, com Ruth Cardoso, então primeira dama, que trabalhou na unificação dos programas de transferência de renda e de combate à fome no país.
Além de Roma, a comitiva na região foi formada pelos ministros Ciro Nogueira (Casa Civil), Tarcísio Gomes de Freitas (Infraestrutura) e Bento Albuquerque (Minas e Energia).

A esquerda comunista imaginária
Em São João da Barra, durante a fala presidencial, o som falhou, e foi rebatido por Bolsonaro: “essa sonoplastia é de esquerda”.
Aos aplausos — e gritinhos — da plateia, sempre que se referia à oposição, Bolsonaro usou o termo “esquerdalha” para se referir ao campo progressista. Depois, fazendo uma comparação com o “verde e amarelo” do seu governo, relacionou os “vermelhos” ao “terrorismo, violência, corrupção e inoperância”.
Bolsonaro convenceu os seus apoiadores mais radicalizados que existe uma “ameaça comunista” no Brasil. Além de ser um completo despautério — não há grupos comunistas relevantes no país, tampouco que se identificam com a esquerda radical —, é mais uma forma de tratar os opositores como criminosos e inimigos. E de levar a campanha para a “guerra”.
O PT, apesar de possuir alas radicais, nunca atuou em seus governos como partido de extrema-esquerda. Pelo contrário. Colhendo os frutos podres dessa escolha, governou com o centro, com os liberais e o grande capital. De extremo, só temos o Bolsonaro na disputa eleitoral.

Os Garotinhos
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Anthony Garotinho aproveitou a vinda do presidente como mais uma tentativa de voltar à cena política. Enfrentando diversos problemas na Justiça, que conferem incerteza sobre a possibilidade de candidatura futura, Garotinho vem conversando com o “União Brasil”, partido formado da fusão PSL-DEM, assim como Clarissa.

Demonstrando muita animação em ter trazido o presidente a Campos, Clarissa parece ser a mais alinhada ao bolsonarismo do clã Garotinho. Não raro aparece em fotos sorridentes com a ministra Damares Alves e com o deputado Hélio Lopes. Ambos bolsoaristas radicais muito ligados às pautas de costumes. Clarissa também vem votando com o Governo Federal no Congresso, inclusive em pautas polêmicas, como a PEC dos Precatórios.
Acompanhado de Clarissa, o presidente Bolsonaro foi recebido no aeroporto Bartolomeu Lisandro na última segunda, pelo prefeito Wladimir (Foto: Supcom)
Acompanhado de Clarissa, o presidente Bolsonaro foi recebido no aeroporto Bartolomeu Lisandro na última segunda, pelo prefeito Wladimir (Foto: Supcom)
No caso de Clarissa, se considerarmos todas as pesquisas recentes, o alinhamento ao bolsoarismo pode diminuir ainda mais sua capilaridade eleitoral, em queda há algum tempo.
Wladimir parece ser o que mais rejeita a aliança. Contrariando o presidente, o prefeito de Campos atua na pandemia de maneira responsável, ouvindo especialistas e a ciência. Com maturidade, costuma colocar os interesses de Campos acima de questões ideológicas. Conversa com todos, inclusive adversários históricos do clã de seu pai. Wladimir se mostra um prefeito disposto a superar entraves ideológicos para realizar um governo marcante na cidade, e cacifá-lo (ou algum outro nome do grupo) à reeleição (ou outros voos políticos). Apesar das dificuldades, Campos é uma cidade de relevância nacional, e um bom governo aqui credencia.
Se continuar nessa linha, dificilmente Wladimir estará apoiando deliberadamente Bolsonaro em 2022. A depender dos arranjos partidários e de seu grupo, poderá ser obrigado a compor, mas não dá sinais de que radicalizará, utilizando termos como “esquerdalha” e afins.
Em ano de eleição, arroubos retóricos são comuns, e qualquer evento passa a ser ato político. Faz parte da democracia. Mas a lei existe para ser cumprida e garantir o funcionamento das instituições democráticas. Descumprir lei eleitoral e fazer discurso de ódio não pode ser tolerado. Quem passivamente acompanha, e ainda aplaude, se iguala.

 
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As várias questões que envolvem a "lei das sacolas" em Campos
23/12/2021 | 03h26
Desde a última terça-feira (21), os campistas não precisam mais pagar pelas sacolas em suas compras. Com a publicação da lei municipal 9.120, os estabelecimentos comerciais de Campos “ficam expressamente proibidos” de cobrarem por utilização de sacolas “para a embalagem e transporte de produtos adquiridos no varejo”. A cobrança era permitida por outra lei (8473/19), essa estadual, de autoria do deputado Carlos Minc, que já trazia a justificativa em seu artigo primeiro: “proteção do meio ambiente fluminense”.
Diminuir a quantidade de plástico em circulação é consenso; pelo menos entre os minimamente responsáveis com as questões ambientais. Porém, repassar ao consumidor o custo das sacolas plásticas é um caminho viável?
Responder afirmativamente essa questão pode ser uma visão reducionista do problema. O que parece colocar em lados opostos os supermercados, que defendem seus interesses econômicos, e os que defendem os direitos da população e a preservação ambiental, deve ser encarado com responsabilidade.
Nessa equação, não restam dúvidas: o lado mais frágil é o consumidor. As famílias vêm pagando um preço alto pela inflação, pela queda do ritmo da economia e pelo desemprego. Penalizar os consumidores com mais uma cobrança, tendo que arcar com embalagens para transportar suas compras, afeta diretamente o orçamento de muita gente. Para atuar nessa trincheira, na defesa dos mais vulneráveis, o Procon é um órgão fundamental.
Como será a aplicação da lei municipal?
Em Campos, a competente advogada e secretária executiva do Procon, Priscilla Nunes, falou sobre o assunto, e já alerta: “O decreto determinando qual órgão fiscalizador, para fiscalizar o cumprimento da lei, foi publicado hoje e a fiscalização já está nas ruas, com denúncias dos estabelecimentos que não estão cumprindo a lei”. Sobre um possível prazo de adaptação dos comércios, ela explica que a “lei já está em vigor e o cumprimento é imediato”.
— O cidadão pode se proteger fazendo a denúncia diretamente no Procon, que é o órgão responsável para fiscalizar o cumprimento da lei. Ela (a lei) é pública e notória, já está em todos os canais de comunicação, e de conhecimento de toda polpação. Vamos fazer cumprir nosso papel de fiscalização. — disse Priscilla, perguntada se o Procon faria ações de conscientização .
Sobre a questão ambiental, com os possíveis impactos negativos que a volta da distribuição gratuita das sacolas pode trazer, a secretária informou que o Procon “está muito preocupado com a questão ambiental”, mas que não teria “equipe e competência técnica para avaliar”. Para suprir essa necessidade, já está buscando parcerias para “atuar nessa avaliação técnica das sacolas plásticas”.
Direitos e deveres de consumidores e empresários
Segundo pesquisa da Associação Paulista de Supermercados (Apas), a cobrança das sacolas descartáveis reduziu em 84,4% a circulação por ano, significando que 27 mil toneladas de plástico deixaram de ser descartados. Por outro lado, a distribuição gratuita das sacolas auxilia o acondicionamento do lixo doméstico, hábito comum entre os brasileiros, principalmente na população mais vulnerável. Passa a ser uma questão de saúde pública, o descarte indevido de lixo nas ruas. Além disso, cobrança é diferente de educação ambiental.
Talvez a solução para equacionar as teses válidas de defesa do consumidor e de proteção do meio ambiente, esteja na compreensão de todos envolvidos que é necessário cuidado e responsabilidade nos resíduos — entre eles os plásticos pós-consumo — e sobre a necessidade de reciclagem. Fiscalização e ações de educação ambiental devem andar juntas.
“Tivemos diversas fases. Primeiro tivemos a vitória da troca de sacolas plásticas por biodegradáveis. Logo depois, a cobrança das sacolas que acabou onerando os consumidores. Acredito que essa lei municipal veio para proteger as pessoas vulneráveis, que são os consumidores. Agora, no meu entender, cabe a cada um se conscientizar para ter o consumo responsável dessas sacolas”, resumiu Priscilla.
Sempre que a sociedade precisa de uma lei impositiva e onerosa para educar sobre a proteção do elemento principal para a existência humana, é dado um recibo de irresponsabilidade, de todos. Para que Campos consiga manter essa proteção aos consumidores, a preocupação ambiental deve ter sido aprendida.
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Prefeitura fecha parceria para recuperação do patrimônio histórico em Campos - Arquivo será o primeiro
04/08/2021 | 09h10
O patrimônio histórico de Campos recebeu na noite desta quarta-feira (4) uma excelente notícia. Em postagem nas suas redes sociais, o prefeito Wladimir Garotinho (PSD) anunciou a assinatura de Termo de Cooperação com a Sociedade Artística Brasileira (Sabra) para recuperação do patrimônio histórico do município. A Sabra é uma associação civil com sede em Betim (MG), com atuação em todo território nacional. Nesta parceria, ficará responsável pela captação de recursos. O convênio, que será realizado através da Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima (FCJOL), terá, segundo a prefeitura, como primeira ação a recuperação do Solar do Colégio, onde está instalado o Arquivo Público Municipal Waldir Pinto de Carvalho, em Tocos, na Baixada Campista.
O Arquivo de Campos possui um acervo histórico de valor inestimável. Considerado "guardião da memória de Campos", o equipamento está entre os cinco melhores arquivos públicos do país e se transformou em referência para a região, uma vez que traz sob sua tutela documentos essenciais para a compreensão da formação de todo Norte Fluminense. Além de guarda, manutenção e restauro de documentação histórica, o Arquivo atua para oferecer acessibilidade à pesquisadores e população em geral, e ainda tem a função Constitucional de tratar os documentos produzidos na atualidade pelo município (veja mais: O Solar e o Arquivo - simbiose que há 20 anos salva a história de toda uma região
Reprodução
 Campos possui vasto potencial para o turismo cultural e, para superar a crise vivida no município, estamos buscando parcerias para viabilizar melhorias para nosso município. Nossa história, que é tão rica e está presente em nossos prédios históricos, merece ser valorizada. Vamos assinar um acordo de cooperação técnica com a Sabra para revitalização dos prédios históricos de Campos, buscando valorizar a memória e o patrimônio cultural. Estamos otimistas no êxito dessa parceria —, declarou Wladimir através de matéria da Supcom (veja aqui).
A notícia representa um alívio para quem se preocupa com a cultura e a preservação do patrimônio histórico em Campos, principalmente em tempos de perdas como as ocorridas com os incêndios do Museu Nacional, no Rio de Janeiro em 2018, e da Cinemateca em São Paulo, há poucos dias. Além do Arquivo, o Termo de Cooperação pretende autuar na recuperação do Mercado Municipal e o Museu Olavo Cardoso.
 
 
 
 
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Reunião do Comcultura aprova Carta Aberta, "Abraço", Comissões e pede Audiência Pública
02/07/2021 | 11h19
A reunião extraordinária do Conselho Municipal de Cultura (Comcultura), finalizada às 22:10h desta sexta (02) — que teve pico de 53 participantes, entre conselheiros e ouvintes — deliberou sobre a proposta do prefeito Wladimir Garotinho (PSD) de entregar a administração do Parque Alberto Sampaio à Associação dos Evangélicos de Campos (AEC), passando a chamá-la de “Praça da Bíblia”. O espaço público abriga um anfiteatro que foi batizado, desde 2017, com o nome do diretor teatral, poeta e carnavalesco Antônio Roberto de Góes Cavalcanti, o Kapi (confira aqui), morto em 2015, o que levou a muitas manifestações da classe artística e cultural do município (confira aqui), e motivou a reunião do Comcultura.
Após a abertura e falas iniciais — unânimes em defender a memória do diretor teatral —, franqueadas aos ouvintes, iniciou-se a discussão dos pontos para aprovação dos conselheiros (veja proposta do governo aqui). Entre os mais polêmicos, foi decidido, com 18 votos favoráveis, pela criação de duas comissões para acompanhamento das discussões, uma no Legislativo e outra no Executivo municipal (para a efetivação da cessão e da renomeação do espaço público, é necessário aprovação na Câmara de Vereadores). Além das comissões, foi aprovada a confecção de uma Carta Aberta e a realização de manifestações em rede social, pelo Conselho. Na Carta deverão conter um pedido para que o governo apresente o projeto de uso e que a gestão passe a ser feita pela FCJOL e pelo Comcultura. As comissões deverão ser formadas, com eleição de seus representantes, em nova reunião do Conselho, marcada para a próxima terça-feira (6).
Foram aprovadas pelos Conselheiros, também, a realização de “manifestações de carinho” pelo anfiteatro que leva o nome de Kapi. Entre elas um “abraço”, com artistas e agentes culturais contornando o local, além de uma exposição que relembre as peças teatrais e poemas do artista, exposta no anfiteatro. A conselheira Aline Portilho, titular da Câmara de Instituições de Ensino Superior, indagou sobre a existência de “plano de ação” e do termo de cessão: “Como fica essa relação com a FCJOL, caso o espaço seja realmente cedido e mude de nome? Existe termo de cessão? Está claramente esclarecido (o uso do espaço)? Haverá audiência pública?” questionou a conselheira.
A comissão que acompanhará o assunto no Legislativo deverá solicitar a realização de Audiência Pública para discutir o assunto com mais profundidade, e auxiliar na decisão dos vereadores. A conselheira Iara Souza, suplente na Câmara de Teatro, lembrou que podem existir diversos “conflitos de interesses” no uso do espaço — pela associação de evangélicos e dos artistas. O titular da mesma Câmara, Fabrício Simões, lembrou que a Constituição Federal veda o que ele chamou de “privatização do espaço público”.
Auxiliadora Freitas, presidente do Comcultura e da FCJOL (veja mais aqui sobre sua posição), e Katia Macabu diretora executiva das Artes e Culturas, presentes na reunião, defenderam a democratização do uso dos espaços públicos, mas também a necessidade de revitalização, e alegaram que não foram consultadas pelo governo. Ressaltaram a importância de preservar a memória de Kapi e de defender os espaços culturais em Campos.
A ouvinte Nilza Gabby, professora da UENF, defendeu uma praça para todos: “A praça deve ser dos espíritas, dos agnósticos, dos holísticos, dos universalistas, dos mormons, dos ateus...A praça é de todos. Não dos evangélicos. Quem administra e conserva é a gestão pública. Quero estar apoiando o Governo, mas isso não”. Simonne Teixeira, também professora da UENF, reafirma a necessidade de audiência pública: “penso que qualquer decisão sobre a praça deve acolher as reivindicações aqui apresentadas e, neste sentido, apoio a necessidade de uma audiência pública”.
 
 
 
 
 
 
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Entre erros e acertos, uma semana da política real em Campos
30/05/2021 | 08h51
Servidores protestam em frente ao Legislativo campista, durante semana tumultuada.
Servidores protestam em frente ao Legislativo campista, durante semana tumultuada. / Folha1
Foi uma semana tumultuada. Para quem acompanhou a semana das movimentações políticas em Campos sabe que o adjetivo usado não despretensioso. O prefeito Wladimir Garotinho divulgou um vídeo em sua rede social — após aprovação de 12 dos 13 projetos que enviou ao legislativo — dizendo que existia na Câmara “um grupinho que só quer tumultuar”. Porém, há de se reconhecer que 13 projetos complexos enviados depois do meio-dia, para serem votados poucas horas depois, por 25 vereadores que não os conheciam, causam tumulto mesmo.
Tumulto que custou ao governo ao menos sete vereadores de sua base governista e uma exoneração no secretariado. Embora o presidente do Legislativo, Fábio Ribeiro, tenha feito mea-culpa sobre o prazo curtíssimo para que os vereadores apreciassem os projetos, o governo parece ter decidido assim fazê-lo numa tentativa de depurar seu apoio na Casa e fazer um teste para a votação das contas da ex-prefeita Rosinha Garotinho. Se por estratégia ou por atabalhoamento, é preciso admitir que houve erro e também que não atentou-se que entraria em jogo a realpolitik (veja um excelente resumo aqui, no Blog de Aluysio Abreu Barbosa).
A maioria dos projetos — chamados de austeros pelo governo — afetavam servidores e questões tributárias do município. Muitos vereadores perceberam rapidamente que suas bases eleitorais seriam atingidas e passaram a criticar o que passou a se chamar “pacotão de maldades”. ‘Pacotão’ que passou a se tornar público com o excelente trabalho jornalístico de Arnaldo Neto (veja aqui). Embora para o governo tenha passado a ser um tumulto só, imprensa e poder legislativo estiveram em suas posições obrigatórias em uma democracia: fiscalização, dando transparência aos processos políticos e trazendo para as discussões a sociedade civil organizada.
A semana tencionou a Câmara de Vereadores e um grupo que se autodenominou independente foi formado, com destaque para Helinho Nahim e Rogério Matoso. Três vereadores engrossariam o coro da oposição aos projetos, caso acatassem a ordem do partido (PDT), dada em comunicado oficial pelo ex-candidato a prefeito de Campos e dirigente partidário, Caio Vianna. Caso Fábio Ribeiro perguntasse na sessão, aos pedetistas, o que decidiram após a manifestação de Caio, eles poderiam responder: “foi solenemente ignorado, vossa excelência”.
Audiência Pública discute a carga tributária do município.
Audiência Pública discute a carga tributária do município. / Folha1
Tencionado o legislativo campista poderia ter tido mais altivez e em plenário, com o regimento debaixo do braço, ter solicitado que os projetos tivessem sua votação adiada, após apreciação no tempo possível. Fábio Ribeiro, a despeito de ter perdido vereadores da base, demonstrou mais uma vez que tem controle da Casa, aprovando, na correia, os projetos. Dentre eles o importante Plano Municipal de Cultura, mesmo tendo sido feito sem Audiência Pública e discussão na Comissão correlata, mas com primordial trabalho do vereador Fred Machado.
Tumultuada ou não, semana deixa várias lições. Que a passada ensine as próximas.
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O Solar e o Arquivo - simbiose que há 20 anos salva a história de toda uma região
18/05/2021 | 05h16
PMCG
Alguns séculos antes do Arquivo Público Municipal Waldir Pinto de Carvalho existir, a construção que o abriga já estava lá — bela e imponente. Essa coisa da “imponência” pode chegar aos “ouvidos” de quem lê de formas diferentes. A forma intencional aqui é trazer ao leitor as projeções mentais de uma construção antiga, sólida e grande. A maior construção histórica em alvenaria de toda região Norte Fluminense. O Solar do Colégio — morada do Arquivo há 20 anos — foi construído pelos padres da Companhia de Jesus, no século XVII. Uma fortaleza erguida em Tocos, na mítica Baixada Campista, que resistiu aos séculos e ao abandono, mas que renasceu há duas décadas.
Como toda construção histórica, carrega em suas paredes marcas de um passado glorioso. Mas também tenebroso. Marcas que visíveis no Solar. No século XIX, ele foi sede de uma das maiores fazendas escravistas do Brasil, contando à época com mais de 1500 escravos, entre nativos e negros. Como conta a historiadora Larissa Manhães, hoje integrante da equipe do Arquivo: "ele (o Solar) foi construído com tijolos queimados e telhas fabricados na própria fazenda. Cada um desses tijolos continham as marcas de produção deixadas pelos cativos que lá trabalhavam, marcas que, feitas com as mãos são um registro da severa escravidão ocorrida naquele local”. O majestoso Solar também abrigou em seu interior o primeiro hospital da região, destinado a prestar atendimento de saúde aos escravos.
Seu antigo proprietário, João Batista Vianna Barroso, o “Sinhô Barroso”, se recusou a abandonar o Solar e apenas depois de sua morte, em 1980, a desapropriação foi finalizada. Antes disso, e ainda de acordo com Larissa, no dia 24 de julho do ano de 1946 — e graças a uma campanha feita por Alberto Lamego, um pesquisador e memorialista campista, nascido em Itaboraí — o Solar do Colégio e outros bens foram tombados pelo Iphan. O Solar foi inscrito no Livro de Belas Artes sob o número 308. O Solar é considerado como sendo um exemplar da arquitetura jesuítica e portuguesa, valorizada à época.
PMCG
Hoje ele continua uma fortaleza. É guardião nossa história. Abriga uma das instituições culturais mais importantes da região e é considerado o 5º melhor Arquivo Público do país. O nosso Arquivo comemora hoje 20 anos de existência. Na concepção fria, um Arquivo tem a função de conservar e tronar disponível os documentos acumulados por órgãos dos poderes executivo e legislativo, no âmbito da administração municipal, garantindo a memória do município através desses documentos. Mas, em uma região essencial para compreensão do país como é o Norte Fluminense, o Arquivo se torna um instrumento vivo, protegido pelos tijolos cheios de marcas do Solar do Colégio. Que devemos lutar para que assim permaneça. Vida longa ao Arquivo!
Rafaela Machado, atual diretora: 
 
“A comemoração desses 20 anos do Arquivo é certamente um marco na história da instituição e representa divulgar ao público e tronar cada vez mais conhecido o Arquivo e seu acervo. Eu sempre repito que não existe Arquivo sem o Solar e Solar sem o Arquivo, a gente precisa de um e do outro para dar vida. E pensar também, nesse momento tão importante da história que precisamos defender a descentralização dos equipamentos culturais, dos espaços de cultura e universalizar o acesso. É isso que a gente planeja e pretende para os próximos anos de atividade do Arquivo”.
 
Carlos Freitas, primeiro diretor do Arquivo:
“Esse 18 de maio, e os próximos, deve ser comemorado como um marco para a preservação da memória da região Norte Fluminense, pois o Arquivo Público Municipal, criado há 20 anos, é um fato da mais alta importância. Não consigo esquecer as lutas e conversas com políticos e pessoas envolvidas com a cultura de Campos. Justiça deve ser sempre feita à luta e perseverança da professora Lana Lage e apoio de instituições como a UENF. Essencial foi o apoio do vereador Edson Batista, autor do projeto da lei municipal de criação do Arquivo. Não consigo citar todos os que apoiaram esse projeto, mas foram essenciais também. 
Uma instituição de preservação de documentos é primordial para que os cidadãos e o poder público possam contar com informações sobre o passado da região, e assim, se basear em novos empreendimentos. Desejo, profundamente agradecido, a todos os que partilharam comigo da implantação do Arquivo Público Municipal Waldir Pinto de Carvalho, o mesmo entusiasmo e dedicação, além de trabalho árduo, para o engrandecimento e continuidade de uma instituição com permanente dedicação à preservação da memória da região Norte Fluminense”.
Edson Batista, ex-vereador, autor da Lei que criou o Arquivo:
"Quando decidi criar a Lei do Arquivo Público Municipal de Campos em 2001 foi para centralizar os documentos da história de Campos, que estavam dispersos em vários locais. O acervo da UENF estava na Casa de Cultura Villa Maria e o Solar do Colégio iria ser a sede da Escola Brasileira de Cinema e Televisão que o Darcy Ribeiro havia projetado para a UENF, mas que não saiu do papel. Foi quando o governador Anthony Garotinho então cedeu o prédio do Solar do Colégio, que pertencia ao estado e iria ser utilizado para a Escola Brasileira de Cinema e Televisão da UENF, para ser a sede do Arquivo Público Municipal de Campos com o objetivo de guardar e disponibilizar para pesquisas o acervo da nossa história.
"Quando os Diários Associados encerraram o Monitor Campista, o acervo do Monitor foi para os Diários Associados no Rio de Janeiro. Houve um movimento pela volta do acervo do Monitor para Campos e eu pude colaborar para a volta do acervo do Monitor para Campos porque entre os locais pensados a Câmara foi escolhida para ter a guarda do acervo do Monitor, que depois foi encaminhado para a Biblioteca Nacional no Rio de Janeiro para digitalização. Na Escola Municipal de Gestão do Legislativo (Emugle), criada na minha administração, tínhamos a Central de Digitalização, onde digitalizamos documentos como atas da Câmara, livros de escritores de Campos e revistas de Campos, que foram disponibilizados na Biblioteca Digital Campistana hospedada no portal oficial da Câmara Municipal. Depois de 20 anos de história da minha Lei que criou o Arquivo Público Municipal de Campos, a luta agora deve ser pela digitalização do acervo do Arquivo Público para que este possa ser disponibilizado para o mundo inteiro por meio da internet. O caminho é este. Na Emugle também realizamos cursos sobre a História de Campos, de Paleografia e Restauração de Documentos, em parceria com o Arquivo Público, ministrados pela Rafaela Machado e sua equipe para qualificação de pessoal para realizar serviços específicos necessários para o trabalho fundamental desenvolvido pela equipe do Arquivo Público, que é um patrimônio de Campos e região, que precisa ser valorizado, recuperado e preservado porque trata-se da nossa memória e da nossa história, que não pode ser perdida e esquecida. Vida longa ao Arquivo Público Municipal de Campos!"
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Sobre o autor

Edmundo Siqueira

edmundosiqueira@hotmail.com