Juiz interdita abrigos e Prefeitura de Campos reafirma compromisso com política de acolhimento
Dora Paula Paes e Maria Laura Gomes 26/06/2025 21:50 - Atualizado em 26/06/2025 21:53
Rodrigo Silveira
O juiz Márcio Roberto Costa determinou a interdição imediata de dois abrigos em Campos. Na sentença, o Juízo da Vara da Infância e Juventude determinou à Fundação Municipal da Infância e Juventude (FMIJ) que tome providências, seja levando as crianças para hotéis ou casas, já que os menores acolhidos nas instituições não podem continuar em locais sem infraestrutura, como "falta de janelas, tomando água fervida e comendo salsicha". Outra decisão foi abrir um boletim de ocorrência na Polícia Civil. Também, na data de hoje, o Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), através da promotora Anik Assed, ajuizou ação civil pública contra o Município e a Fundação. Já a Prefeitura de Campos, em nota, reafirma seu compromisso com a política de acolhimento.

As duas intervenções são de emergência. Segundo ele, todo mundo tem que saber o que está acontecendo em um município milionário como Campos. "A gente não está falando de luxo. É obrigação do município fazer isso, entregar isso. É o mínimo que eles têm que estar fazendo. O alimento é essencial. Higiene é essencial. Estamos falando de coisas básicas", disse.

Ao dizer que perdeu a paciência, ele relata o que foi constatado, por exemplo, no abrigo Portal. Segundo ele, a cozinha está em estado deplorável, com concreto à mostra, obras inacabadas há muito tempo, muita sujeira e um imóvel sem condições de acolher ali 30 crianças. Não tem janela, é um vão aberto. Imagina esse frio! Tem só um vidro e a janela está quebrada. Toda a estrutura... não tem janela nenhuma, só uma cortininha. Não tem cama. Tem um esgoto ao lado do refeitório, estourado. Muita sujeira. Não tem chuveiro, não tem banho quente. Então, a gente está falando do inferno", disse o juiz.

No Portal da Infância, chamou atenção da Justiça, durante fiscalização, a falta de estrutura. "Não tem janela, é um aberto. Imagina esse frio. Tem só um vidro e está com a janela quebrada. Só uma cortininha. Não tem cama. Tem um esgoto do lado do refeitório, estourado. Muita sujeira. Não tem chuveiro, não tem banho quente. Então, a gente está pensando no inferno. Estamos falando de crianças de 0 a 17 anos", disse o juiz.

De acordo com ele, foram realizadas fiscalizações nos oito acolhimentos e todos apresentaram problemas. A questão da alimentação também chama atenção do juiz, principalmente pela quantidade de salsicha. "Não sou nutricionista, mas salsicha não é alimentação para ser disponibilizada de forma rotineira", disse, e ainda acrescentou: "Tem medicamentos vencidos, além de falta de produto de limpeza que não está sendo disponibilizado pela Fundação, sendo comprados pelo pessoal das instituições."

"Está um caos. Hoje, chegou a um ponto que eu perdi a paciência. Tem criança no Lar de Lara que está sem leite e sem água potável. Estão fervendo água para dar às crianças. Essas crianças estavam em situação de risco em casa ou na rua. A Fundação da Infância recebe um valor muito alto, milhões, não dá para aceitar essa situação. Tomara que a coisa mude. A gente tem processos e está dando decisões", disse o magistrado.

Ele explicou que o Ministério Público também tem feito fiscalização.
Prefeitura reafirma compromisso com a política de acolhimento
Em nota, a Prefeitura de Campos reafirma seu compromisso com a política de acolhimento e proteção às crianças e adolescentes, conduzida com responsabilidade e diálogo permanente com as instituições envolvidas. Também explica que "atual situação é reflexo de um desequilíbrio orçamentário provocado, dolosamente, pela suspensão dos repasses do cofinanciamento estadual na área da saúde desde o final de 2024, comprometendo significativamente as finanças municipais e exigindo readequações em diversos setores."

Ainda assim, o orçamento destinado à Fundação Municipal da Infância e Juventude, permanece, de acordo com o governo municipal, proporcionalmente, acima da média per capita do município, demonstrando a prioridade na política de proteção social. "Nos últimos 30 dias, foram promovidas mudanças no organograma da administração municipal e na presidência da FMIJ. As medidas adotadas terão seus efeitos percebidos ao longo do segundo semestre", finaliza a nota.
Promotora Anik Rebello
Promotora Anik Rebello / Divulgação - MPRJ
MP ajuíza ação civil publica contra o município e Fundação da Infância e Juventude 
O Ministério Público do Rio de Janeiro, por meio da Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva da Infância e da Juventude de Campos, ajuizou, no final da tarde desta quinta, ação civil pública contra o município de Campos e a FMIJ, com o objetivo de assegurar o regular abastecimento de oito serviços de acolhimento institucional mantidos pela fundação.

A iniciativa decorre de diligências realizadas pelo MPRJ, que constataram a falta de itens essenciais, como proteínas (carnes brancas e vermelhas), leite para bebês, papel higiênico, além de outros produtos básicos de alimentação, higiene pessoal e limpeza. A ausência desses insumos compromete diretamente a dignidade e o bem-estar das crianças e adolescentes acolhidos e constitui flagrante violação aos direitos fundamentais previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

Atualmente, aproximadamente 150 crianças e adolescentes encontram-se sob medida protetiva nas referidas unidades, em decorrência de situações de vulnerabilidade e violação de direitos.

Na ação, o MPRJ requer, liminarmente, que o Juízo determine a regularização do abastecimento no prazo máximo de 24 horas. Em caso de descumprimento da ordem judicial, foi solicitado que seja fixada multa diária e determinado o afastamento dos gestores públicos responsáveis pela omissão no fornecimento dos insumos. Diante da gravidade dos fatos, o Ministério Público espera que o Município adote providências em caráter emergencial, restaurando de forma imediata as condições mínimas de funcionamento dos serviços de acolhimento.

“É inaceitável que crianças e adolescentes, já marcados por graves violações, sejam novamente submetidos à negligência, justamente quando estão sob a guarda e responsabilidade do poder público municipal. A omissão compromete não apenas direitos básicos, mas também a confiança no sistema de proteção”, disse a promotora Anik Assed.

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