Atender esses alunos vai muito além de garantir a matrícula. Esse é apenas o primeiro passo da inclusão. É preciso uma infraestrutura escolar adequada e profissionais de apoio capacitados para acompanhar de perto o processo de aprendizagem dessas crianças, garantindo que elas tenham oportunidades reais de desenvolvimento.
Sobre o primeiro tema, a infraestrutura, os dados do Censo Escolar revelam lacunas preocupantes. Das 206 escolas da rede municipal, apenas 42 contam com salas de recurso multifuncionais, espaços fundamentais para oferecer atendimento educacional especializado. Essas salas permitem que alunos com necessidades especiais recebam acompanhamento individualizado e utilizem recursos pedagógicos adaptados, condição essencial para que possam aprender de forma efetiva.
Além disso, apenas 28 escolas da rede municipal dispõem de material pedagógico adaptado para a educação especial. Isso significa que a grande maioria dos alunos com necessidades educativas específicas não tem acesso a recursos adequados, fundamentais para seu aprendizado. Ou seja, não têm livros, jogos, tecnologia assistiva e outros recursos que facilitam a aprendizagem. Sem esses materiais, os estudantes dependem muitas vezes da criatividade e do esforço extra dos professores, o que amplia desigualdades dentro da própria rede de ensino.
Não é incomum que os professores da educação especial na rede municipal precisem se desdobrar para criar seus próprios materiais didáticos, diante da escassez de recursos disponíveis. Os dados não deixam dúvidas: a oferta de equipamentos e recursos pedagógicos é insuficiente para atender às necessidades dos alunos. É preciso reconhecer que esses profissionais desempenham um papel fundamental na inclusão, muitas vezes indo muito além do que lhes é exigido. Mas, como diz o ditado, “uma andorinha sozinha não faz verão”. A sobrecarga limita as oportunidades de aprendizado, pois os docentes precisam lidar com turmas heterogêneas e uma rotina marcada por excesso de responsabilidades e apoio insuficiente.
A situação se agrava ainda mais pela falta de formação continuada e capacitação específica. O número de professores temporários na rede é expressivo, e muitos desses profissionais que passam a atuar no atendimento especializado não recebem treinamento adequado para lidar com diferentes tipos de deficiência. Isso é especialmente preocupante em um município que possui instituições históricas voltadas à prática pedagógica e à defesa da educação de qualidade — há potencial humano para oferecer capacitação, mas ele nem sempre é plenamente aproveitado.
A verdadeira inclusão exige mais do que matrículas ou promessas de campanha eleitoral. É necessário um olhar atento às condições reais de ensino e aprendizagem, um compromisso com a formação de professores e o fornecimento de recursos adequados. Campos dos Goytacazes tem o desafio — e a oportunidade — de se tornar referência em educação inclusiva, garantindo que cada aluno, independentemente de suas necessidades, possa exercer plenamente o direito à educação e à cidadania. Transformar a lei em prática concreta não é apenas uma obrigação legal do governo municipal, mas um passo fundamental para o desenvolvimento social e econômico da região.
Ana Beatriz Xavier é doutoranda em Sociologia Política pela UENF, pesquisadora assistente do Núcleo Norte Fluminense do INCT Observatório das Metrópoles e tutora de apoio para alunos com necessidades educacionais especiais na fundação Cecierj.