Felipe Fernandes - O coração da Marvel
*Felipe Fernandes 06/08/2025 08:34 - Atualizado em 06/08/2025 08:33
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Filme: "Quarteto fantástico - Primeiros passos". Pode parecer estranho para o fã de quadrinhos mais jovem, mas o Quarteto Fantástico foi o primeiro grande quadrinho da Marvel, responsável junto a revista do Homem Aranha, pelo sucesso da editora em seus primeiros anos. Criados por Stan Lee e Jack Kirby no ano de 1961, a primeira família da Marvel foi pioneira em introduzir dramas familiares, com ficção científica, em uma mistura entre a realidade e o fantástico, em aventuras que vão muito além da mera ação, sendo responsável por estabelecer algumas das principais categorias do que viria a ser o Universo Marvel nos quadrinhos e nos cinemas posteriormente.

Eis que após 36 filmes, finalmente o Quarteto Fantástico entra para o MCU, em um filme sem amarras com tudo o que assistimos até aqui, ambientado em uma realidade paralela retro-futurista, aparentemente na década de 60, o filme foge da história de origem e traz o grupo já estabelecido como os grandes heróis daquele universo, resgatando algumas das principais características e principais conceitos do grupo, em uma aventura muito bem sucedida em trabalhar seus temas e seus dramas, sem perder o tom de aventura e com um tom de urgência bem forte, algo que me surpreendeu.

Se esse é seu primeiro contato com o grupo, pode ir sem medo, já que além de não precisar ter assistido nada da Marvel posteriormente (nem me recordo a última vez que isso foi possível), o filme tem uma eficiente introdução formato de programa televisivo, que de uma maneira bem dinâmica, explica as origem dos poderes do grupo e como em 4 anos, eles se tornaram famosos e queridos do grande público.

O filme traz muito forte esse aspecto sci-fi, através de toda a estética retrô-futurista e do desenvolvimento da história, que está diretamente ligada a uma ameaça espacial. O filme trabalha muito bem a dinâmica de família, seja na interação entre eles no cotidiano, seja nas sequências de ação. A química entre os atores funciona e cada um deles ganha algum drama pessoal, ainda que o foco maior fique no casal Sue Storm e Reed Richards, que estão prestes a ter um filho, um elemento primordial dentro da narrativa e certamente para o futuro do MCU.

O egocêntrico e mulherengo Johnny Storm nunca fez muito sentido na origem do grupo, afinal, ele não tinha razão para estar presente na nave. Aqui, ele surge como um astronauta e tem uma função narrativa que explora essa característica, o tornando um personagem mais relevante, indo além dos seus poderes.

O Coisa é construído como o personagem mais carismático do grupo. Ele caminha pelas ruas de seu antigo bairro, faz alegria das crianças e não tem tanto daquele lado ranzinza comum ao personagem. Seu principal dilema, sempre foi a maldição de seus poderes, afinal, ele é o único que teve um ônus com ele, algo que é levemente sugerido aqui. Outro dilema importante na trajetória do Quarteto, é a culpa que Reed carrega do acidente que rendeu a eles os poderes, principalmente, pela situação do Coisa. Um elemento que também é pouco explorado, ainda que seja mencionado, mais de uma vez.

Mas a personagem que mais cresce no longa é Sue. Se Reed é o gênio científico, Sue é o centro emocional do grupo e do filme. Criadora da Fundação Futuro, ela é uma mulher muito influente e vista como uma espécie de grande diplomata, certamente a mais influente do grupo junto ao mundo, elemento fundamental dentro da narrativa, ainda que me incomode demais essa ideia de um mundo ingênuo e unido e principalmente, a retratação de Nova York como centro do mundo.

A maternidade traz novas questões, é engraçado ver o casal tentando se acalmar, dizendo que nada vai mudar. Quem tem filho sabe, não senhores, tudo vai mudar. Lógico que dentro do filme, isso é levado a outro patamar, mas a gravidez é uma temática importante dentro do filme e para seus desdobramentos. Mais que lidar com Galactus, o filme é sobre esse novo momento da família, o que torna tudo mais próximo do espectador.

Por falar em Galactus, esse é um dos grandes acertos do longa. Desde o visual do personagem, a escala imponente, o senso de perigo, passando pela estética de sua nave, que se não é inovadora, é opressiva o suficiente e bem coerente com a situação do gigante, que apesar de ser o devorador de mundos, ganha um background interessante, que faz com que o grande dilema do filme ganhe um peso dramático poderoso. Confesso que nesse sentido, esperava um filme muito mais leve, não tem piada em excesso, alívio cômico, o aspecto dramático é muito mais presente e intenso, o que fortalece a Surfista prateada e Galactus enquanto ameaça.

É curioso, que dá pra traçar um paralelo entre esse filme e o filme do Superman, lançado 15 dias antes e que tem vídeo aqui no canal. São duas obras que fogem das origens, começando a narrativa em universos com heróis já estabelecidos, trazem histórias mais otimistas, com mensagens de esperança, uma estética mais colorida e principalmente, abraçam alguns exageros dos quadrinhos, que geralmente são pouco explorados nos cinemas.

Eu gosto das cenas de ação, da dinâmica de grupo, da forma como eles conseguem trabalhar seus poderes em conjunto, acho o dilema entre escolher o fim do mundo e a vida de seu filho, uma questão forte e de fácil compreensão, é um dilema moral que representa a tensão entre sacrifício pessoal e valor absoluto da vida humana, qualquer pessoa consegue se identificar com esse dilema. O terceiro ato é bem empolgante, ainda que o desfecho seja um pouco forçado, quebrando um pouco a forma cuidadosa como tudo era trabalhado até ali.

Finalmente podemos dizer que temos um filme que faz justiça a primeira família da Marvel. Essa aventura grandiosa em escala, mas contida em sua necessidade de ser um bom filme e não mais uma promessa do que virá (ainda que a cena pós-crédito faça questão de jogar uma promessa), fazem do filme uma aventura gostosa de assistir, que funciona em tudo que se propõe.

Quarteto Fantástico: Primeiros passos fecha como uma história isolada, centrada em dilemas familiares e decisões éticas, com foco em personagens e valores. É menos sobre salvar o mundo e mais sobre salvar o que dá sentido a ele: a família. Uma conclusão emocional, que devolve ao Quarteto seu lugar como coração da Marvel.

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